sexta-feira, 22 de setembro de 2017

A HISTÓRIA DA CORRUPÇÃO NO BRASIL



A despeito do atual cenário, a corrupção, embora muitos queiram, não é coisa recente. Não é algo surgido nestes últimos anos e nem está atrelada apenas a um governo ou partido. Acabo de ler - Corrupção e poder no Brasil: Uma história, séculos XVI a XVIII - escrito pela historiadora e professora da Universidade Federal de Minas Gerais, Adriana Romeiro. O livro é um testemunho contundente acerca da corrupção como fenômeno de nossa identidade. Ela existe desde o momento em que Cabral colocou os seus pés nesta terra.

Ao contrário do que muitos historiadores sustentam, a presença do império português no Brasil se deu não de uma forma absolutista, mas por conta da criação de redes que garantiram a ascensão de uma elite nacional. Foi por meio da corrupção que as elites locais puderam se constituir e tomar parte no jogo do poder e nos lucros. As nossas elites só se tornaram bem-sucedidas fazendo uso de práticas pouco convencionais.

Não só a corrupção é antiga no Brasil, mas também a sua instrumentalização como arma política. Adriana Romeiro demonstra que desde o século XVI, existiam autoridades acusadas de corrupção, destituídas de seus cargos, enviados de volta a Portugal, presas, com seus bens sequestrados em função de rivalidades políticas. À época, a coroa portuguesa definia algumas práticas consideradas corruptas.

O governador, por exemplo, não podia se envolver com negócios, ter qualquer atividade econômica no local em que ele estava atuando. Mas, na prática, os moradores do Brasil achavam que era legítimo um governador enriquecer ao longo do exercício do cargo, desde que o patrimônio do rei não fosse prejudicado e os vassalos não sofressem alguma violência. O limite sempre era muito tênue. De um modo geral, as pessoas eram complacentes em relação aos desvios.

Na avaliação da autora, esta dinâmica foi fundamental para a preservação do sistema que assim sobreviveu durante séculos. Se fosse um império mais rígido, não iria se sustentar por muito tempo. A sobrevivência do Brasil enquanto colônia estava ligada a essa configuração mais fluida. Foi por meio da corrupção que as elites locais puderam prosperar e participar tanto do poder como dos lucros. A pretensa fidelidade à Coroa Portuguesa era medida pelos dividendos que podiam ser auferidos.

A constatação mais explicita daquilo que nos constituiu como nação é o fato de que sempre houve um pequeno grupo que durante séculos se valeu da corrupção como prática recorrente para garantir privilégios. No período colonial, se tem uma visão muito negativa do Estado por parte dos mais abastados. Entende-se que ele é um inimigo que vem para apenas cobrar impostos e colocar obstáculos à iniciativa privada. Trata-se o Estado como um estorvo para as pessoas.
No fundo, o que vemos hoje, continua sendo muito parecido. Um Estado para ser espoliado, roubado, saqueado. Uma oligarquia política que continua, salvo poucas exceções, pensando e agindo para que as nossas riquezas sejam dilapidadas. Uma população que, em grande medida, é incapaz de fazer qualquer autocrítica e, por isso, tende a “terceirizar” a solução para os dilemas da vida pública.

Por conta de nossa trajetória, a existência de uma classe política corrupta também indica para a existência de uma sociedade impregnada pela cultura do “jeitinho” em seus múltiplos subterfúgios. A corrupção não fica restrita à esfera pública ou estatal. Ela é sistêmica e, por vezes, parte da nossa convivência cotidiana. A corrupção mostra o abismo entre a lei e as atitudes, entre aquilo que é norma e o que as pessoas fazem no seu dia a dia.

Há uma série de comportamentos que são proibidos, mas que, na prática, as pessoas exercitam sem escrúpulos. Trata-se de uma característica bem peculiar à nossa identidade. As condições sempre favoreceram a cultura da corrupção no Brasil. Ela sempre fez parte da nossa história e superá-la, requer, sobretudo, compreender melhor o passado e avaliar com discernimento o presente para que tenhamos a capacidade de descortinar novos caminhos no futuro.

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