sexta-feira, 30 de junho de 2017

DESVANECER



Tudo é passageiro. Nada escapa do fim.
Importa jamais ser ingrato, insolente, cínico ou grosseiro.
Se magoar, ainda que tenha sido sem querer, tenha humildade para reconhecer.

Seja verdadeiro e leal em tudo o que fizeres.
Exercite a gentileza, o carinho e a gratidão.
Esmera-te em transformar palavras em atitudes.

Se não conseguir encontrar a palavra certa, estenda a mão, abrace.
Aspire ternura, compaixão, carinho, afeto. 
Aprenda que pessoas que se ausentam nas tuas maiores dores, não são confiáveis.

Entenda que muitos, mesmo tendo recebido o melhor de ti, nunca haverão de exercitar a gratidão.
Perceba que poucos estarão contigo nas piores agonias do teu caminhar.
Saiba que as grandes desventuras serão as maiores lições da tua caminhada.

Por medo, covardia ou indiferença, alguns simplesmente haverão de abandoná-lo, desprezar, esquecer.
Os frutos da tua benevolência, infelizmente, não serão multiplicados por corações ignóbeis.
Neste mundo com tanta avareza e dissimulação, a coerência tem sido dos valores, o mais ínfimo.

Eis a grande tragédia da jornada: as pessoas que, em vida, morrem na gente, embora continuem existindo.

sexta-feira, 23 de junho de 2017

VERDADES E VALORES DA MODERNIDADE



A nossa sociedade está doente. Reina a insensibilidade, o consumo desregrado de álcool, as drogas ilícitas, o exercício arbitrário do poder, a persuasão e manipulação do outro com base em um suposto status legitimador. Vão sendo colocadas em pauta novas demandas com o intuito de garantir o narcisismo e o gozo ilimitado. Tudo vai convidando para a falta de compromisso e a mediocridade. A tão sonhada vida moderna com as suas ambiguidades, vai sendo descortinada por caminhos sem grandes objetivos, sonhos ou utopias.

Todos os dias surgem inúmeros exemplos que almejam colocar o superficial e o transitório como valioso, como um ideal de vida capaz de suprir as nossas maiores carências. Os heróis efêmeros da música, do esporte, da moda, são criados e recriados pela mídia como exemplos a serem seguidos e imitados.

Uma grande parcela da população nem percebe que vive fugindo dos seus próprios dilemas, do compromisso com o bem comum, da solidariedade com os mais sofridos, da honestidade como valor primordial para uma sociedade melhor.

Confundimos a felicidade com o bem-estar, o amor com o sexo, liberdade com o ideal de fazer o que ‘der na telha’. Vivemos o tempo da inércia e da passividade. Tempo onde corremos para encher a vida e o cotidiano de coisas, imagens e ruídos.

Somos capazes de entrar em contato com qualquer desconhecido em algum extremo do planeta por intermédio das inúmeras parafernálias tecnológicas, mas a cada dia conhecemos e falamos menos com nossos vizinhos. Sabemos muito, mas entendemos pouco.

A nossa sociedade está carente de indivíduos que sejam exemplos no falar e no agir. Cidadãos e cidadãs que empenhem a sua palavra de forma comprometida em defesa da vida em todas as suas dimensões. Pessoas que sejam capazes de incendiar corações e mentes para uma caminhada em plenitude.

Basta de tantas palavras interesseiras e mesquinhas. Basta de tanta mentira e ganância. Basta de tanta frivolidade. De palavras sem alma e profundidade nos discursos políticos, nos sermões religiosos, nos ensinamentos dos professores e mestres. Já não é mais possível aceitar que continuem sendo propagadas palavras carregadas de uma retórica vazia de sentido. Palavras presas a um academicismo sem relação com a justiça e um mundo mais fraterno e humano.

As pessoas são cotidianamente aturdidas por falsas promessas e condicionadas por sentidos que não podem conduzir para a realização interior. Somos incitados a viver nesta sociedade pela via do isolamento, dos constantes transtornos psíquicos, da tristeza, dos desencontros e desencantos.

É impossível construir um mundo e uma realidade carregada de sentido em plenitude para a vida humana sem aprender ou reaprender o valor da convivência. Precisamos, urgentemente, de uma relação que esteja alicerçada na partilha, no respeito, no bem comum.

Torna-se imperioso encontrar caminhos que permitam um desenvolvimento humano sustentável e capaz de atender as necessidades de todos os indivíduos de forma equitativa. Que priorize a qualidade de vida e não apenas a quantidade de bens materiais. Que ensine a respeitar, amar e cuidar do meio ambiente natural.

É imprescindível sacudir consciências. Animar e entusiasmar para o protagonismo em prol de um mundo melhor. Arregaçar as mangas para sermos instrumentos de paz e fraternidade. Cultivar os valores e as verdades que não passam. Celebrar a vida enquanto dádiva, no amor e na esperança de dias melhores.

Os caminhos para a consolidação de verdades e valores que nunca haverão de passar somente irão acontecer quando formos capazes de olhar os nossos semelhantes não como estranhos ou rivais, mas como aqueles que estarão sendo inseridos na nossa história, nos nossos sentimentos, nos nossos sonhos.

sexta-feira, 16 de junho de 2017

EDUCAÇÃO E CIDADANIA



Apesar das melhorias na distribuição de renda nas últimas décadas, o Brasil continua sendo um dos países mais desiguais do mundo: 3,6% das famílias mais ricas do país detêm quase 40% de toda a riqueza nacional. O 1% mais rico da população, recebe por mês, cem vezes mais do que os 10% mais pobres da população. Essas desigualdades são resultado da ação humana. Trata-se de algo que foi sendo construído socialmente ao longo da história do país.

Muitos de nós somos educados para acreditar que tamanha desigualdade é algo natural, quase um destino, resultado de uma “ordem divina”, uma “sina”, ou mesmo “culpa” daqueles que não souberam esforçar-se o bastante para melhorar a sua vida. Se pararmos para pensar na nossa própria trajetória e na de muitos dos nossos conhecidos, independente do esforço pessoal, sabemos que, conforme a família, o contexto, a situação, teremos ou não, maiores chances de ter uma vida digna.

Há uma verdadeira “loteria social” que faz com que, uma criança, pelo simples fato de nascer em uma família indígena ou negra, tenha muito mais chances de morrer no primeiro ano de vida. Se ela nascer menina, terá muito mais chance de sofrer violência doméstica e de receber, quando adulta, um salário inferior ao de um homem na mesma função. Se essa menina, então, for negra, poderá receber um terço do salário de um homem branco. E se a criança for um menino negro, quando jovem, terá duas vezes mais chances de morrer assassinado do que um jovem branco. Se nascer em uma comunidade de baixa renda, sem saneamento básico, terá mais probabilidade de ter uma expectativa de vida bem menor do que uma criança que nasceu em uma família de classe média.

A educação no Brasil é marcada por essas mesmas desigualdades: as crianças, adolescentes e jovens negros, são os mais excluídos das escolas; as crianças do campo têm mais chances de estar fora da escola do que as crianças das cidades, assim como as crianças com deficiências; as escolas que ficam em regiões mais pobres, na maior parte das vezes, são aquelas que oferecem uma educação de pior qualidade; muitas crianças, adolescentes, jovens e adultos de famílias de baixa renda sonham em cursar medicina, engenharia ou direito, mas, para isso, enfrentam muitas barreiras e desafios para que seus sonhos sejam concretizados.

Para que um país seja mais justo é necessário que o Estado seja firme em promover ações que enfrentem essas desigualdades. Além de possibilitar o acesso ao conhecimento produzido pela humanidade, deve estimular o desenvolvimento de habilidades como a leitura, a escrita, a capacidade de cálculo. Por outro lado, uma das funções primordiais de uma educação de qualidade é promover uma formação crítica e criativa. Coisas imprescindíveis para o exercício da cidadania. Uma formação que possibilite aos estudantes compreender os mecanismos que geram essas desigualdades e contribuir para o desenvolvimento de ações para superá-las. Uma educação que questione a grande tolerância da sociedade brasileira para com as desigualdades, que estimule os estudantes a conhecerem seus direitos e a perguntarem o porquê das coisas serem do jeito que são.

Infelizmente, é com muita tristeza, que tenho visto gente defendendo que as escolas não deveriam tratar dessas questões. Receio que seja gente que, na sua maioria, pouco conhece de um ambiente escolar, mas que, mesmo assim, motivada pelo senso comum, acredita que as escolas devem ser proibidas de discutir os “porquês” das desigualdades. Alheios aos fatos insinuam que tudo é “politicagem”, “oportunismo partidário”, “pedagogia alienante”. Escola deveria ensinar apenas abstrações matemáticas, empreendedorismo e meritocracia.

Em minha caminhada de quase três décadas, ao lado de educadores e educandos, em dezenas de escolas públicas e privadas, não foram poucos os exemplos de flagrante humilhação que, infelizmente, tomei conhecimento. Conheço dezenas de educadores denunciados às autoridades competentes por estimular estudantes a refletirem criticamente sobre a realidade. Dessa forma, alimenta-se a ideia de que a função da escola é silenciar sobre os conflitos sociais, estimular a acomodação, o individualismo e responder somente às demandas de um mercado de trabalho que não oferece empregos dignos, mas estimula a competição e o consumismo insano.

A política não é somente exercida por meio de governos, partidos, entidades empresariais, associações, sindicatos, movimentos sociais e organizações da sociedade civil. Ela também é exercida no conselho escolar, no grêmio estudantil, nas associações de mães, pais e mestres, nos coletivos juvenis e de cultura, nos grupos de futebol e em vários outros espaços do cotidiano da vida, no dia a dia das pessoas. Ela está presente o tempo todo na nossa vida, inclusive na forma como nos relacionamos no trabalho, nas comunidades, nas famílias, nas ruas, com as pessoas, sejam elas desconhecidas ou amigas.

Por fim, é importante, que TODOS debatam abertamente essas questões. Que os posicionamentos sejam sempre embasados e bem firmados no diálogo, no respeito e na partilha. Carecemos, e muito, de um entendimento que deixe de lado picuinhas e “achismos” em detrimento de uma construção na qual o direito humano a uma educação plenifique a crítica e a criatividade. Uma educação que amplie a qualidade de vida para e pela cidadania.