sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

ANALOGIAS DE VIDA



O filósofo alemão Arthur Schopenhauer presumiu, quase duzentos anos atrás, que a humanidade estava fadada a oscilar, eternamente, entre os extremos de angústia e tédio. Passado tanto tempo, não é de se estranhar que este quadro desafiador e preocupante decorre, em grande medida, por conta da experiência cada vez mais vazia, individualizada, materialista e alicerçada no pragmatismo e na racionalidade. Existência que é sempre tão marcada pela memória de tudo aquilo que vivemos e que se esmiúça através de cenas, palavras e sentimentos.


Homens e mulheres lutam para convencer-se de que são comandantes da própria jornada. Mas esta suposta onipotência não subtrai nossas limitações. Muitas vezes, por mais que tentemos não nos antecipamos a incidentes. Não conseguimos dar a grande guinada que tanto idealizamos. Na maioria das vezes nos vemos impotentes para contornar imprevistos: desastres, doenças, perdas. Basta um instante crucial e sonhos são adiados ou se perdem para sempre.


O imperativo da modernidade pragmática em querer explicar, compreender e dominar os mistérios da existência não passa de uma ilusão. A despeito das aflições, os caminhos do porvir continuam imperscrutáveis. O que permanece de forma insofismável não é aquilo que racionalmente conhecemos da vida, mas aquilo que preenche o nosso coração, fazendo-se eterno. Vivemos num mundo que prefere o disfarce do conhecimento à suavidade do abraço, da compaixão e da mão estendida.


Podemos, simultaneamente, gerar vida e arrastar para a o abismo. Na estrada e na rotina das decisões, todos são de alguma forma, protagonistas. Quanto maior a cordialidade, maior a disposição para sentir-se acolhido. Sabedoria carece de ambientes serenos. Humildade e empatia precedem supostas verdades alicerçadas na eloquência. A cada passo vamos descortinando novos caminhos e dilemas. Necessitamos aceitar o desafio de nunca abandonar o ofício de aprendiz.


Não percebemos que podemos ir embora a qualquer momento. Que a ilusão da posse é descabida e que somos apenas administradores do espaço onde nos situamos. Sequer temos a possibilidade de governar o sopro que sustenta a vida. A nossa percepção deveria ser clara e evidente: cada minuto, cada dia, cada encontro, é uma espécie de bônus nesta nossa efêmera jornada. Resta-nos compreender que o amor, o carinho e a bondade, são recursos que antecipam aquilo que imaginamos eterno.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

HIPOCRISIA E IMORALIDADE SEM LIMITES


A consequência mais trágica na atual conjuntura nacional é a destruição do Brasil como nação e a aniquilação moral das suas instituições. Com o corte de verbas, há um esfacelamento das pesquisas e o fechamento de instituições. A situação das universidades públicas beira o caos. São medidas que vão contra a ciência, contra a pesquisa, contra a educação e a saúde pública. Há perdas incalculáveis em termos de avanços, recursos e capacidades. O que está em curso é uma grande bagunça. Algo que talvez nunca tenha havido em nossa história mais recente.

Do ponto de vista econômico, não há outra palavra que sintetize melhor o momento que vivemos do que o fato de que o Brasil parece estar à venda. Grandes corporações internacionais cercam o governo em busca de nossas reservas naturais. Perdoam-se dívidas imensas. A economia paralisada. Cada vez mais desempregados. Empresas sendo fechadas ou com a capacidade ociosa para muito além do esperado. A tal recuperação econômica é pura retórica. Uma falácia.

Mas o mais grave é a deterioração moral das instituições brasileiras. O governo perdeu qualquer pudor, qualquer senso de limite, de razoabilidade, de respeito. É um governo que promoveu gente envolvida com falcatruas para altos postos de comando. A perda de vergonha se transformou em cinismo e deboche. Não há mais escrúpulos e nem decência. É esta gente que se sente à vontade para se promover e proteger. Eles desprezam as exigências de uma mínima moralidade.

Tornou-se normal que o presidente da República, o presidente da Câmara e o presidente do Senado tenham pesadas denúncias sobre seus ombros. Os diferentes protagonistas do governo e do Congresso se articularam para tornar juiz do STF alguém com declarada filiação e atuação política, acusado de coagir subalternos, advogar para o PCC e Eduardo Cunha. Poucos lembram, mas foi ele que conduziu com pirotecnia e estardalhaço a tal prisão de terroristas de mentirinha durante as olimpíadas. Também estaria envolvido com propinas e de ter um patrimônio milionário incompatível com seus rendimentos. Afora isso, sustentou a proibição da indicação de pessoas que exercem cargos de confiança e, não por último, plagiou em sua tese e livros.

Eu pergunto: se alguém assim se torna ministro na mais alta Corte de Justiça do país, encarregada de zelar pela Constituição e pelo sentido das leis dentro de um Estado que se diz democrático e de direito, que força terá, por exemplo, um professor em sala aula para solicitar que os alunos não plagiem trabalhos na internet? O que está acontecendo é a destruição dos valores elementares dentro de uma sociedade que preze pela harmonia. Difícil mesmo é perceber que uma grande parte desta mesma sociedade, vive como se estivesse anestesiada. Julga que faz parte do jogo político.

Qual é o sentido que resta neste país quando se nomeia um ministro para a Corte Suprema com a intenção de que proteja corruptos? O que se pode esperar da moralidade quando os juízes são íntimos daqueles que deveriam julgar? Como entender que haja regramento para determinada decisão, mas, pouco depois, de acordo com supostas conveniências, tudo muda? Onde fica a coerência? As nossas autoridades perderam as medidas, os critérios, a sensatez, a prudência e, sobretudo, a vergonha. O Brasil dos nossos dias está caminhando para a conflagração.

Estados como o Rio de Janeiro e o Espírito Santo em situação de convulsão. O governador do Rio afirmando que os manifestantes são “vândalos". Vândalos, eu diria, sem receios ou melindres, são aqueles que por lá saquearam os cofres por anos a fio. O governo do Espírito Santo supondo que a "sociedade se tornou refém da polícia". Que absurdo! É a polícia e a sociedade que são reféns de governantes incompetentes. Sociedade e polícias são vítimas de um jogo de interesses e de manipulação política. E o que faz o governo federal diante do caos? Coloca tanques nas ruas, numa demonstração de força estúpida e incompetente. Quer passar a imagem de que as coisas estão no seu devido lugar, equilibradas e tranquilas.

Todos os que aprovaram as mudanças recentes na conjuntura política brasileira são, em maior ou menor grau, responsáveis por aquilo que hoje vislumbramos. Por ingenuidade ou manipulação, cúmplices. Custa entender como é possível silenciar diante do fato de que gerações estão caminhando rumo a um futuro incerto. Custa, sobretudo, ver alguma lógica na estranha atitude de quem fazia retumbar seus gritos contra a corrupção e que agora silencia, mesmo diante de tanta desfaçatez. Há uma grande parte da população que continua, ao que parece, assim como em outros momentos, sendo instrumentalizada para ver e defender aquilo que convém. Faz-se de conta de que não é conosco e deixa-se triunfar o cinismo. No entanto, nada do que acontece nos dias atuais é fruto do acaso.

O que se vive nos últimos tempos neste país é digno de um filme de terror. Os confrontos, a matança nos presídios, o crescimento da criminalidade, da violência, do desemprego e da pobreza. É a destruição das instituições em um governo que não dialoga. A continuar assim, sem escrúpulos, sem moral e sem vergonha, o caminho inevitável será o da barbárie. Da bagunça generalizada. Da imposição dos mais fortes. É preciso reagir antes que o estrago seja maior. É preciso sair da anestesia e tomar as ruas. A busca da cidadania e da justiça sempre serão as melhores formas de construir um caminho que mostre o nosso lugar neste país que todos e todas amamos.

O Brasil não pode continuar nas mãos daqueles que o estão destruindo. Os jovens precisam de esperança, os trabalhadores empregos e dias melhores e os idosos a garantia de que serão amparados nas suas dificuldades. É preciso reconduzir o Brasil pelos caminhos da democracia e da vontade popular. Assegurar direitos conquistados com luta, suor e lágrimas. O Brasil precisa, com urgência, de um governo decente que seja capaz de nos conduzir a todos pelo caminho do bem e do entendimento. Basta de imoralidade e hipocrisia.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

INDIGNAÇÃO, DESÂNIMO E PERSEVERANÇA.



O planeta caminhando dia após dia para um colapso ambiental. Pessoas morrendo de fome, perdendo empregos, vivendo na completa ausência de quaisquer direitos ou garantias individuais. O consumismo corroendo a vida, dissipando laços, tornando o afeto uma simples mercadoria. Há guerras, xenofobia, terrorismo, ortodoxias, machismo, patriarcalismo, patrimonialismo, preconceito, dor, doenças e mutações promovidas pela própria ciência.

Vivemos em meio a uma polarização de ideias. Cada dia o egoísmo fica mais forte e a educação, já em frangalhos, piora um pouco mais. Nunca tivemos tanto apreço pela economia ditando as normas do corpo e da mente. Ricos cada vez mais ricos. Pobres condenados do berço ao túmulo. Os do meio na esperança de dias melhores mesmo sabendo que dificilmente as coisas haverão de melhorar.

Governos alinhados com a hipocrisia. Empresas controlando governos. Constituições sendo rasgadas. Totalitarismos de esquerda e de direita reaparecendo em cada canto. Hospitais abarrotados e a corrupção inundando a vida pública e privada. Violência, roubo, tráfico, assassinato, escravidão, propina, nacionalismos. Entretenimento vil e desvirtuado. Liberdade de expressão confundida com liberdade de opressão. Fascismo e ódio pelas redes virtuais. Poluição, lixo, depressão, moeda, bolsa. Insegurança, abandono, desamparo, tristeza, insegurança, crise social, individual, natural, nacional, mundial.

Homens que pagam por corpos em qualquer canto na abjeta prostituição. Que maltratam física e psicologicamente mulheres diante de qualquer tipo de insatisfação, desobediência ou manifestação. Um país no qual gerações que estão apenas começando a sua jornada vivem apenas as frágeis e ilusórias alegrias incipientes das bebedeiras, das drogas e dos e jogos de azar clandestinos. Uma sociedade que promove o desenvolvimento com negociatas que garantem o lucro para poucos e os juros abusivos para quem menos tem. Compra-se na ilegalidade. Forjam-se eleições. Barganham-se consciências garantindo regalias e capricho pessoais.

Não bastasse tamanha loucura na sociedade que vivemos, eis que uma meia dúzia de moralistas fica por aí preocupada em julgar o comportamento alheio, mesmo que este comportamento não lhe diz respeito e também não vá prejudicar ninguém. Pior, são estes que andam por aí construindo templos e casas de oração. Com seu fundamentalismo astuto e indecoroso prometem redimir os pecados de muitos. É por conta de tudo isso que é preciso muita perseverança para não sucumbir ou desanimar.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

DEVANEIOS



Anseio falar do que não é efêmero.
A dor de saber-se pequeno já me basta.

O tempo aprisiona e resplandece em sua magnificência indelével.

O vento da noite repercute a quimera das estrelas e acaricia a imensidão do intangível horizonte.



Firmamento que, em seu esplendor, multiplica fantasias.

Consciência que testifica verdades circunscritas ao olhar e sentir.

Tempo que faz verter lágrimas cálidas e ressentidas.



Onde estaria a divina virtude do amor?

Nos campanários ou nas torres das catedrais onde o vento é senhor?

Transcendência e fragilidade.

Encanto e mistério.



Nas cinzas de minha alma.

Na memória impiedosa das ilusões.

Mágoas, recordações, perdas.

Chorar a rima perdida.

Um louco a perscrutar impiedosas ilusões em inebriantes noites estreladas.