Fico
a me perguntar sobre as atitudes dos mensageiros da intolerância, os discípulos
do olho por olho, dente por dente. Os embaixadores da moral e da tão desejada
ética. O que haveriam de dizer acerca de um homem que manifestou seu amor por
um ladrão e lhe prometeu o paraíso? Repercutiriam o velho discurso que bandido
bom é bandido morto? Quem sabe, repetiriam a admoestação de que a sociedade
necessita de um novo Messias?
Tenho
para mim que uma boa parcela dos brasileiros e brasileiras assim como os
ilustrados moralistas da violência, aqueles que defendem com unhas e dentes a
pena de morte e também que se amarrem adolescentes em postes para linchá-los
até caírem desmaiados ou sem vida, integram comunidades religiosas, oram,
louvam e acreditam que o Filho de Deus, Jesus Cristo, é o exemplo a ser seguido
pela humanidade.
Esquecem,
no entanto, que Jesus escolheu os oprimidos e renegados. Os miseráveis,
leprosos, prostitutas, bandidos. Solidarizou-se com a escória da sociedade.
Contestou a ordem vigente. O homem de Nazaré foi um dos primeiros inspiradores
e defensores dos direitos humanos e do diálogo. Foi perseguido, castigado e
morto pelo Império Romano para servir de exemplo. Da mesma forma como se
pretende que sirvam de exemplos os jovens que são amarrados em postes e
espancados, na ilusão de que a violência se resolve com violência. Todos são
conhecedores da mensagem cristã, mas preferimos a prática romana. Somos
implacáveis e impetuosos.
Qual
seria o lugar de Jesus nesta nossa Jerusalém carregada de preconceito,
intolerância, covardia e desejo de resolver as diferenças pela força e não pelo
diálogo? É bem provável que Jesus seria hostilizado, difamado, depreciado. É
possível que não sobrevivesse. Afinal de contas, é sempre um risco imenso
defender a tolerância, o amor ao próximo e o perdão, quando o ódio é tão
desproporcional.
Sua
história e seu exemplo demostram que Ele não estaria com as centenas de
fariseus que aplaudem a violência sem se darem conta de que este é um problema
social crônico e intrínseco às desarmonias políticas, sociais e econômicas do
mundo neoliberal. Ele não estaria com aqueles e aquelas que fazem negócios
dentro das Igrejas prometendo prosperidade e vida sem percalços. Ele não
estaria com políticos inescrupulosos que, em nome Dele, escondem a podridão de
suas atitudes.
É
uma pena que a sua mensagem não desperte em nós a consciência profética para
não fechar olhos e ouvidos neste nosso imenso Brasil onde, por exemplo, mais de
4 mil mulheres são espancadas todos os dias; onde a metade dos índios mortos
são crianças; onde 70% dos mais de 30 mil jovens, entre 15 e 29 anos, mortos em
2015, eram negros.
Uma
pena que a mensagem de Cristo seja cada vez mais uma incidência circunstancial
e não reprise tantas demandas éticas nas ações cotidianas. Uma pena que a
redução da maioridade penal tenha virado a solução em tempos de corrupção
desenfreada e falta de vergonha na cara. Uma pena que nossos presídios mais se
parecem com “centros de amnésia” da nossa desumanidade. Uma lastima que nosso
Congresso Nacional seja o local de uma bancada, denominada evangélica, composta
pelos parlamentares mais corruptos do país.
Se
Cristo voltasse é certo que não concordaria que homossexuais fossem
discriminados, mulheres violentadas, índios assassinados, negros linchados em
praça pública. Jamais haveria de concordar que o ódio, a intolerância e a
mentira fossem usados, deliberadamente, como artimanhas para alcançar o poder.
Seu lugar seria com os favelados, carentes de humanidade, sem vez e voz.
Diante
de tanta covardia e indiferença com a dor alheia. Diante de tantos que julgam
sem conhecer, interpretam sem preocupar-se com a verdade, emitem juízos
carregados de preconceito e cegueira, ainda espero que as ideias e a história
de Jesus nascido na pequena Nazaré, sirvam, pelo menos, para induzir à
reflexão. Se em nossos dias amar tem sido um ato de coragem, convém deixar o
ódio para os covardes e indiferentes.