quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Espiritualidade Moderna


O que caracteriza os tempos em que vivemos é a falta de respostas para a questão do sentido da existência. Parece que ainda estamos, por enquanto, numa nebulosa expectativa para alcançar algumas possibilidades que nos permitam obter a resolução deste dilema.

A modernidade agoniza. Tornou-se refém deste vazio aberto no coração humano pela cultura da abundância que diariamente nos desafia e estimula. Nunca a felicidade foi tão ofertada. Da forma como é mostrada, parece estar ao alcance das nossas mãos, nas gôndolas dos supermercados, na loja da esquina, na propaganda sem escrúpulos.


No fundo, na verdade, a vida está cada vez mais vazia. A alma se dilacerando, seja pela frustração de não poder alcançar esta felicidade imediata, seja por acumular os produtos deste fascinante mundo do consumismo e descobrir que, ainda assim, a vida não consegue ser saciada ou suprida no seu sentido mais profundo.

 
A publicidade repete, incansavelmente, que todo ser humano tem a obrigação de ser feliz, de vencer, de levar vantagem. Ao perceber que não consegue alcançar esta façanha, o indivíduo assimila o sentimento de culpa por seu fracasso. Resta-lhe, na maioria das vezes, uma esperança a ser concretizada por meio de uma fé imediata e de caráter miraculoso. Jesus é a solução de todos os problemas. Não adianta procurá-la nos sindicatos, nos partidos, na mobilização da sociedade.

 
Vivemos num universo fragmentado por múltiplas vozes e nos movemos em direção a um horizonte desprovido de caminhos que nos façam perceber a nossa responsabilidade ética e cidadã com o semelhante. O ser humano vai sendo engolido por uma espiritualidade que se reduziu à esfera privada. Que perdeu a sua função social. Que se ampara num sentido mágico e de autoajuda imediata.


Nesse mundo dito moderno, a religião perde espaço devido à racionalidade científica, o pluralismo de visões, à racionalidade econômica. Já faz tempo que a religião deixou de ser a única detentora de sentido. Seu lugar é ocupado pela mídia, pelos dogmas inquestionáveis de um mercado insaciável, pelo inesgotável leque de propostas esotéricas.
 A crise da modernidade parece favorecer uma espiritualidade que vai sendo moldada às necessidades psíquicas e sociais da falta de sentido, de fuga da realidade contemporânea. É uma espiritualidade impregnada de tradições religiosas egocêntricas.
O sagrado vai sendo moldado aos caprichos humanos. O sobrenatural se curva às necessidades mais imediatas. A solução dos problemas deste mundo acaba sendo transferido para uma realidade celestial. E então, a cura, o alívio, as dificuldades pessoais devem ser enfrentadas, pela autoajuda, pela meditação, pelas técnicas psicológicas e espiritualistas.
 
Vai sendo reduzida a dimensão social do Evangelho e a opção pelos menos favorecidos. A manipulação de um tipo de espiritualidade passa a ser uma ferramenta de poder, de controle de corações e mentes, de barganha por espaço político. A verdade e o bem acabam sempre sendo identificados com a minha crença religiosa. Exige-se uma postura que se coadune com a minha fé, não com o bem, a justiça e o amor.

 
Esta espiritualidade se alicerça na negação do outro e se fortalece em meio a um sistema cujo valor supremo se sobrepõe aos direitos humanos. Aos excluídos deste mundo, resta apenas a opção de se entregarem às promessas de que serão incluídos, cobertos de bênçãos, no outro mundo que se descortina com a morte.

 
É preciso lembrar que todo ser humano foi criado para alcançar a felicidade neste mundo. Para ser instrumento de amor, entendimento e paz. Se há dor e injustiça, não significa que sejam castigos divinos, mas resultado das obras do ser humano e por ele devem ser erradicados.