terça-feira, 17 de março de 2020

A Viagem da Vida

A vida é como uma viagem de trem, com suas estações, alguns acidentes, surpresas, tristezas, lições. Quando nascemos, imaginamos que muitas pessoas especiais sempre haverão de nos acompanhar em nossa jornada. No entanto, logo percebemos que pessoas queridas, ficarão em alguma estação do caminho e nós teremos que continuar sem a sua companhia e amor.

Assim como nos despedimos de pessoas especiais, outras haverão de estar conosco no caminho. É provável que algumas tomarão o trem para descer em alguma estação próxima. Poderão até passar meio despercebidas. Mal nos daremos conta de que deixarão seus assentos desocupados. Outros conseguirão fazer da viagem um tempo irritante e dispendioso. Pode ser que até nos façam desejar desembarcar o mais rápido possível.

Sempre existirão aqueles e aquelas que ao descer, deixarão um vazio definitivo. Existirão também os que mesmo amadas, ficarão em vagões diferentes dos nossos. Durante o percurso permanecerão meio distantes sem que tenhamos a oportunidade de nos sentarmos a seu lado.

A jornada desta vida é cheia de desafios, sonhos, fantasias, alegrias, tristezas, esperas e despedidas. Talvez, o conselho mais importante seja mesmo manter um bom relacionamento com todos os passageiros, procurando em cada um o melhor que eles têm para oferecer.

Com o tempo, aprender a conviver com alguns e tolerar outros. Necessitamos aprender a caminhar ao lado de gente que, na verdade, talvez nem gostaríamos de ter por perto. Apesar dos pesares, eles também consolidam importantes lições e sempre haverão de nos desafiar a sermos melhores.

Ao longo da viagem nesta vida encontraremos quem não partilha dos nossos valores, ideais e sonhos. Gente que é capaz de se mostrar mais pelas facetas do egoísmo, da indiferença ou incapacidade para dialogar. Elas também haverão de nos estimular para que a vida não esteja submissa apenas às tristezas ou mágoas.

Um dos maiores ensinamentos sempre será aprender a lidar com quem nos machucou no decorrer da viagem. Com o passar do tempo, uma das grandes empreitadas em nossa existência será nos tornarmos pessoas mais tolerantes, mas, também, olharmos para as diferentes facetas da vida como lições que nos auxiliam a sermos pessoas que buscam contribuir para o bem comum de forma sábia e equilibrada.

Há pessoas que gostaríamos de ter sempre ao nosso lado. Infelizmente, todo mundo haverá de desembarcar em alguma estação. O grande mistério é que não sabemos em qual estação devemos descer, mas, independentemente do trajeto ou momento, é preciso sempre se esforçar para que a viagem valha a pena, afinal, talvez seja a última.

terça-feira, 3 de março de 2020

A Ignorância e o Poder

Nestes dias conturbados em que presenciamos situações esdrúxulas a cada minuto, a figura do autômato descrita pelo Filósofo e Historiador Alemão, Walter Benjamin, parece fazer bastante sentido. Em seu texto “Conceitos Sobre História”, ele caracteriza assim este personagem: “Conhecemos a história de um autômato construído de tal modo que podia responder a cada lance de um jogador de xadrez com um contra lance, que lhe assegurava a vitória. Um fantoche vestido à turca, com um narguilé na boca, sentava-se diante do tabuleiro, colocado numa grande mesa. Um sistema de espelhos criava a ilusão de que a mesa era totalmente visível, em todos os seus pormenores. Na realidade, um anão corcunda se escondia nela, um mestre no xadrez, que dirigia com cordéis a mão do fantoche.”

O que exprime a ideia da figura de um autômato fantoche, deixa claro as nuances da situação brasileira atual. Vivemos como se fôssemos uma população robotizada, passando por falsas transformações que ocultam uma continuidade de engrenagens do poder que se perpetuam desde a formação do país. Assim como em um jogo de xadrez, nossas jogadas são com as cartas marcadas. Embora as peças sejam diferentes ao longo dos anos, nossa situação, graças aos tantos mecanismos que fomos aceitando, garante a perpetuação de uma série de abusos.

Desde o período colonial até o grito do Ipiranga proclamado por um inexperiente português com disenteria; da pompa imperial a república velha e seu voto de cabresto; do Estado novo de Vargas ao período de exceção confluindo para os dias atuais, o que se vislumbra é uma estranha democracia republicana cheia de conveniências. Mudaram os sistemas de governo, as pessoas, os políticos, as premissas da economia, mas a lógica do poder conseguiu se manter independente do período.

São hábitos, costumes e uma certa cultura política e educacional calcada no uso do estado, da nação e de todos os seus dispositivos para perpetuação de um modelo voltado para o ego individualista, onde poucos se beneficiam com as mazelas da maioria. Onde deveriam, sim, existir ações e pensamentos voltados para o bem-estar de todos. Mas, o que vale mesmo é o sucesso individual, baseado na desgraça dos outros.

Instituições, empresas, órgãos públicos ou privados e a própria população são imbuídas de uma crença onde o seu interesse deve ser garantido para que os objetivos, as metas e a satisfação pessoal sejam supridos. Por este caminho, o que ocorre é uma cegueira geral onde a empatia pelo outro passa a ser desnecessária. Onde se busca garantir as necessidades de vida, consumo, lazer, segurança, saúde, educação, mas, onde, em contrapartida, o desenvolvimento atinge as expectativas e a estabilidade para aqueles que pertencem a um seleto grupo. Vale mais o ganho individual em detrimento do interesse coletivo.

É esta a realidade do Brasil. Uma população com suas ilusões criadas por uma política que mesmo mudando jogadas e jogadores, consegue perpetuar processos e atingir os mesmos resultados, não importando se a partida e o sistema forem diferentes. O resultado sempre será o mesmo, ludibriando e dando a falsa ilusão para aqueles que estão envolvidos no jogo, que podem conseguir uma vitória quando uma nova partida se inicia.