sexta-feira, 26 de agosto de 2016

A COMPLEXA REALIDADE CONJUNTURAL BRASILEIRA - ALGUMAS QUESTÕES PERTINENTES



Como e por que a sociedade brasileira foi seguindo em direção a um dos momentos mais infames de sua história? Este é o meu questionamento e, a partir dele, a minha singela tentativa de “alargar horizontes” e pautar um caminho que possa servir para a sua elucidação. Para além do binarismo (a favor ou contra), arrisco dizer que como o mundo na maioria das vezes acaba sendo exposto em fragmentos, é preciso partir do principio de que existe uma compreensão que tende a ser personalista, localizada, confusa, e, neste caso, dependendo do olhar de cada indivíduo, alinhada com um drama, pesadelo ou novela. Há uma tendência em enxergar as pessoas, separadas em boas e más, e pouco perceber os "interesses" que estão por trás de suas escolhas. Contrapor-se a essa leitura superficial reproduzida na maior parte dos nossos jornais, canais de televisão e internet, é o propósito desta minha reflexão.


Uma das questões que não pode, de forma alguma, ser negligenciada na realidade conjuntural contemporânea tem a ver com o desvelamento dos mecanismos que permitem à elite ser a "mandante" para articular mudanças nos rumos políticos do país. É justamente esta pequena elite não mencionada na trama dos novos conflitos de classe que serve a um pano de fundo para viabilizar a divisão do país. Esse aspecto me parece fundamental à compreensão das razões da crise institucional e política vigente. Não se trata de “limpar” aquilo que está “sujo”, mas a perspectiva de negociar privilégios.


Para mim, o esclarecimento de qualquer situação dos dias atuais depende da reconstrução de sua perspectiva histórica. O presente não se explica por ele mesmo sem que o passado nos desvende a sua origem. É por não compreendemos com profundidade aquilo que aconteceu no Brasil no passado que agora presenciamos o cinismo e as extravagâncias jurídicas garantindo os interesses mesquinhos. Sem uma autocrítica embasada, racional, destituída de falsos moralismos, seremos incapazes de perceber os mecanismos que nos controlam e manipulam. Pior, sequer conseguiremos dispor de meios adequados para nos defendermos diante das tantas artimanhas que invadem nossos lares todos os dias através da cultura midiática. 


Esta realidade na qual uma meia dúzia vislumbra apenas regalias tem feito com que as pessoas se sintam tolas. Com um discurso de combate a corrupção, no fundo, o que vale mesmo é a seletividade. Mal se consegue definir com clareza o que vem a ser a corrupção? Na maioria das cabeças é apenas o agente do Estado que deve ser punido por esse tipo de crime. Este, por sua vez, serve a uma construção arbitrária daquilo que o inimigo político faz. Dentre tantos absurdos, um dos maiores talvez seja o de identificar a corrupção apenas como um sinônimo da vida pública. A corrupção, bem sabemos, está entranhada e, talvez até com maior desenvoltura na iniciativa privada.


Uma das questões que também precisa ser observada é que em todas as mudanças governamentais abruptas em nosso país, sempre a corrupção foi uma espécie de referência incondicional. Talvez por ser um tema conhecido e que se presta, sem grande esforço, a apontar contra “inimigos” políticos de ocasião. A percepção de um jogo de cena numa descarada farsa que aliada a pouca coerência dos personagens da vida política são, portanto, imprescindíveis para mostrar como até a história do Brasil pode ser distorcida quando se pretende “um lugar ao sol”.


A elite do dinheiro é a elite financeira. Aquela que comanda os grandes bancos e os fundos de investimento. É aquela que se associa com a fração das grandes corporações da indústria e do comércio. Aquela que busca “vender” uma conjuntura catastrófica para depois poder assaltar o nosso bolso e abocanhar os recursos pouco importando o destino do país. São eles que ganham com as taxas de juros exorbitantes, mas é a imensa maioria do povo que arca com as consequências. Isso, obviamente, não aparece na maioria dos telejornais, pois são estes personagens da elite econômica que pagam, direta ou indiretamente, a apropriação descarada e indevida ao bolso de toda uma coletividade.


Um aspecto muito importante neste emaranhado é considerar que a exploração material de todo um povo só é possível com a colonização de seu espírito e de sua capacidade para refletir criticamente. É estratégico e serve para quem dita as regras do jogo esta falta de discernimento. Senão, como explicar e entender que o próprio povo legitime desvirtuações, oportunismos, conchavos e, pior, ações contrárias aos seus interesses e, sob o pretexto de combater a corrupção, se acorde num determinado dia com um sindicato de ladrões mandando no país? Esta mistura de questões tem muito a ver com as contradições que o Brasil sempre viveu. São elas que possibilitam compreender, em grande medida, as razões do(s) oportunismos(s), do ódio e das tantas mentiras.


Diante do quadro que vivemos, há que ser observada a ambiguidade de todo o complexo jurídico brasileiro. Ouso afirmar que "os de toga" também assaltam o país com seus salários nababescos e vantagens absurdas. A relação entre o gasto da máquina judiciária e o PIB nacional no Brasil é singular se comparado a outros países. No Brasil gasta-se, comparativamente, cerca de seis vezes a mais que os EUA com o poder judiciário. No entanto, isso não implica em seis vezes mais eficiência na administração da justiça. Muito pelo contrário.


Não é preciso muita perspicácia para perceber o gasto com construções faraônicas, garantias adicionais e indenizações desmedidas, (auxílio moradia, alimentação, educação, creche, etc,) pouca transparência, privilégios corporativos e chantagem política. O recente aumento de 41% em salários já muito acima do padrão revela o tamanho do descolamento deste grupo em relação ao restante da sociedade. Por isso seus interesses se ligam à reprodução, e não a critica dos privilégios injustos. Vantagens corporativas e estratégias políticas são encobertas sob a farsa de "guardião da moralidade pública", montada para os tolos.


Ouso dizer que é fácil juntar pessoas em torno de algo mediado pelo senso comum. Difícil mesmo é dividir as responsabilidades. Esse talvez seja o momento que vivemos agora. O que fazer com aquilo que se consolida a revelia da soberania popular? A luta entre protagonistas políticos e operadores do direito diante do legado da mudança? Como sempre, não se fala em reforma política, mas em reforma da previdência, pois esta, inevitavelmente, atinge a quem foi e continuará sendo o mais onerado neste país – o povo mais simples e vulnerável. Enquanto isso, continuamos a ver e a ouvir a grande mídia divulgando a corrupção e dando a entender que ela é de apenas alguns políticos confinados a um determinado partido. Talvez seja justamente esta mídia a maior inimiga de qualquer ordem democrática.


É preciso desvelar a grande hipocrisia no que tange a "refundação moral do Brasil" e perceber os interesses mesquinhos inseridos nesta realidade. Qualquer cidadão ou cidadã preocupado com um país melhor deveria primeiro dar-se conta desta complexa articulação de interesses sempre encobertos e nunca admitidos. Buscar um maior embasamento diante daquilo que vivemos, vimos e ouvimos, pode nos tornar mais sábios no presente e também no futuro. Afinal, como almejamos saber o nosso caminho diante dos desafios vindouros se mal compreendemos a nossa essência naquilo que o passado nos legou?

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