sexta-feira, 19 de agosto de 2016

A CRUEL INDIFERENÇA



Para muitos o oposto do amor é o ódio, mas na verdade é a indiferença. A indiferença acaba com qualquer tipo de amor próprio. Transforma as pessoas em seres frios e distantes. Não há dignidade, respeito e consideração. A indiferença se alicerça no desprezo e destrói os fundamentos do amor próprio, da autoestima e gera isolamento, depressão, tristeza e dor.

Indiferença é sufocar sem tocar, dizer adeus sem chorar. Indiferença é a frieza e o desprezar de forma perversa e desumana. Talvez seja um dos maiores castigos que uma pessoa pode impor a outra. A indiferença remete o indivíduo a um tipo de desprezo que desinstala e desintegra. Não permite qualquer tipo de aproximação. Não pressupõe qualquer gesto de dignidade e respeito. Impõe ao outro um autoexílio não consentido.

Ser indiferente com alguém é renegar a sua existência com aquilo que ele tem de melhor. É também, por consequência, renegar um pedaço da própria vida. É renegar a essência de uma jornada ancorada em sentimentos e sonhos. Verdades e valores. Erros e acertos. A indiferença não permite ao outro a possibilidade de ser nem bom e nem ruim. É como se tivéssemos matado o outro antes do tempo.

É possível ser indiferente em relação às circunstâncias políticas, em relação a problemas sociais, aos danos nocivos com relação ao meio ambiente, mas descartar outra pessoa machuca e corrói até as lembranças mais nobres. É um subterfúgio covarde utilizado por algumas pessoas que o justificam a partir de desculpas estapafúrdias que em meio a tantas esquisitices da vida moderna apenas reforça o sentido da impessoalidade. Onde a aparência vale mais do que o cuidado, a dignidade e o respeito. Onde o sentimento do outro nada significa.

Ser indiferente tem se tornado tão habitual por acharmos o mundo um lugar apenas para as nossas intenções. Perdeu-se a sensibilidade. Falamos em direitos e dignidade humana, mas, esquecemos a própria disposição para auxiliar corações a acalentar na alma a sensibilidade que permita sonhar com um mundo mais belo. Indiferença aniquila a vontade de seguir tendo o semelhante como intenção na jornada. Joga no lixo aquilo que existe de mais bonito na vida, supõe a mesmice, considera a vida enquanto posse e nunca como dádiva.

Como seria bom se neste mundo existissem seres humanos com sensibilidade e compreensão para a dor do outro. Com atitudes, respeito e interesse sinceros. Pessoas dispostas a estender a mão mesmo sem ter todas as respostas para os dilemas que a vida concentra. Indivíduos que não virassem cínicos no desespero, mas receptivos e dispostos a abraçar na tristeza. Pessoas com compaixão.

Sofrer a indiferença é como retirar erva daninha que cresce em meio às flores. Por mais que nos esforcemos, sempre haverá algum inço insistindo em sufocar o broto da flor. É doloroso perceber que algumas pessoas que fizeram parte de nossas vidas, podem se mostrar apáticas, distantes, rudes. São frias e agem como se fossemos desconhecidos. Pessoas que esqueceram a história que pôde ser vivida, as realizações, os benefícios recebidos. Esqueceram momentos alegres, sonhos construídos em conjunto, dificuldades partilhadas.

Podemos até afirmar que na vida sofremos por amor. Mas, na verdade, sofremos pela indiferença, pela falta de afeto, pelo carinho que se perdeu no tempo, pela música que não toca mais o coração, pelas mãos que deixaram de se entrelaçar. O amor não é ruim, a falta dele é que descortina caminhos imprevisíveis. É comum ouvirmos que o tempo ajuda a aparar arestas e colocar as coisas no seu devido lugar. Esquecemos, no entanto, que a própria vida é frágil e pequena. Não há garantia que o tempo haverá de curar as feridas do passado, a saudade e a solidão.

Nos dias atuais, ao que parece, são inúmeros os motivos que vem exacerbando a vulgarização e a descrença com os sentimentos do outro. Parece existir um medo exagerado quando se consolida um envolvimento ou proximidade diante do qual não temos o controle total das ações. Reagimos de forma fria e distante quando não percebemos respostas prontas ou aquelas que julgamos adequadas para dirimir frustrações, tristezas, dores. Como se a vida pudesse ser colocada numa bolha blindada sempre avessa ao sofrimento e a tristeza.

A indiferença machuca por ser impositiva e cruel. A indiferença representa um nada. A indiferença pode ser comparada a uma moléstia que vai corroendo nosso ser, fazendo-nos cair no vazio trazendo em seu bojo inúmeras enfermidades que aniquilam o equilíbrio e a motivação para os embates da vida. Por reforçar uma perspectiva negativa, transforma os seres humanos em criaturas sem qualquer apelo fraternal, indiferentes ao destino do próximo, sem interesse em valores ou virtudes que possam nos fazer melhores. Torna-nos individualistas, sem inquietudes ou preocupações para além do egoísmo e da mesquinhez.

Como ficar indiferente ao sofrimento de quem nos é querido? Como podemos ver a pessoa sofrer, sem que tenhamos uma atitude de carinho, uma palavra de conforto? Afinal de contas temos pouco controle sobre as atitudes do outro, mas um grande controle sobre nossas atitudes e maneira de agir. A indiferença sempre será incompatível com as necessidades alheias. Sempre haverá de redundar numa impossibilidade de auxiliar aquela pessoa que em algum momento nos foi presenteada pela convivência recíproca.

A indiferença aniquila a nobreza da alma, destrói virtudes. A indiferença nos sofrimentos é dureza de coração. O indiferente não tem coração e não sente; tem alma e não ama. O indiferente não demonstra incomodar-se com a dor alheia, mas, orgulhoso anseia repelir qualquer ideia acerca de algum sofrimento pessoal. O desprezo, o abandono e a indiferença, machucam por serem frutos do orgulho covarde de quem não soube encontrar caminhos para alcançar o entendimento e a reciprocidade.

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