domingo, 7 de outubro de 2018

OS EXTREMISMOS E AS INTOLERÂNCIAS NOSSAS DE CADA DIA!

O consagrado historiador britânico Eric Hobsbawn denominou como a Era dos Extremos o período compreendido entre o início da Primeira Guerra Mundial, em 1914, e o fim da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) em 1991. Foi nesse espaço de tempo que o planeta viu uma guerra explodir na Europa, o comunismo surgir como sistema de governo, o fascismo ganhar corpo e, unido ao seu irmão mais cruel, o nazismo, arrastar o mundo ao seu maior conflito armado de todos os tempos, com o ódio político, religioso e racial em um nível inimaginável.

A civilização conheceu os campos de concentração e as câmaras de gás. Assistiu ao que a genialidade da mente humana, somada ao insano desejo de poder, é capaz de fazer quando as bombas atômicas devastaram Hiroshima e Nagasaki. Ditadores sanguinários, genocídios, perseguições. Stalin, Mussolini, Hitler, Franco, Pinochet, Videla, Sadam, Bin Laden, Bush. Todos eles governaram nessa era dos extremos onde o diferente sempre foi visto como um inimigo a ser aniquilado.

O terrorismo de cunho religioso, com cabeças sendo decepadas em frente às câmeras, trouxe um novo elemento para este cenário. Com as redes de comunicação e, mais recentemente, das redes sociais, as demonstrações de ódio, intolerância, desrespeito e extremismo tiveram seu alcance ampliado. Ataques, insinuações, difamações, mentiras. Xenofobia, homofobia, machismo, racismo, divergências políticas e ideológicas. Esses são apenas alguns dos ingredientes neste caldo de gosto amargo e muito perigoso no qual estamos mergulhados.

Se a coisa já era, por si só, perigosa, a eleição de Trump nos Estados Unidos foi um passo a mais em direção ao recrudescimento da intolerância. De certo modo, Trump é o retrato de um cenário no qual não há nenhuma disposição para a conciliação, mas, para o confronto e o desrespeito ao diferente. As consequências desse processo de desumanização das relações ainda são vistas em seu estado embrionário. E, mesmo neste estágio, percebe-se a criação de um terreno fértil no qual brotam conflitos locais, nacionais e até internacionais.

O extremismo não é filho do século passado. Os grandes impérios da história se ergueram sob o fio da espada. Babilônicos, macedônios, persas, romanos, entre outros. Todas as grandes civilizações antigas expandiram a sua influência e se sustentaram à base de muito sangue derramado. No caso dos impérios modernos, a violência cedeu espaço para a exploração econômica. O capitalismo falou mais alto. Não é nenhuma novidade que hoje os Estados Unidos se consolidaram como a maior potência econômica e militar do planeta. Intimidações militares sempre fizeram parte do repertório norte-americano.

O Brasil, o ultimo país do continente a dar fim à escravidão, colhe nos dias atuais os frutos plantados em séculos de exclusão. Historicamente alijados das instâncias de poder, pobres, negros, índios, sofrem com as mais diversas formas de preconceito. A polarização política e cultural vivida de forma tão intensa pelas pessoas hoje, tem como marco a desigualdade social que permeia toda a história brasileira. No fundo, a polarização que ocorre é, em grande medida, entre a defesa de um projeto integração social e um projeto de capital.

Afogados em um cenário de corrupção quase generalizada, o Brasil parece ter atalhado pelos caminhos do caos nas instâncias do poder. Assim, sem enxergar nas instituições políticas uma representatividade, os cidadãos perderam a capacidade de olhar para a política como o caminho para a resolução das dificuldades. Ser político passou a ser visto como um atestado de desonestidade. Vive-se um sentimento de descrédito generalizado.

Não há sigla política que escape, independentemente de sua linha ideológica. A esquerda não presta para quem é de direita, e a direita não presta para quem é de esquerda. Quando a ordem social fica caótica, o resultado é a polarização e a busca por culpados e “salvadores da pátria”. As pessoas começam a omitir-se em suas próprias responsabilidades e escolhem bodes expiatórios. O resultado é uma onda gigantesca de ódio e intolerância.

A história já mostra que este estado de coisas sempre redundou em consequências desastrosas. O caso mais conhecido é o da Alemanha. Um país que se sentia injustiçado pelos acordos de paz e que, por isso, suscitou a sanha em nominar os responsáveis - os judeus, os imigrantes, os comunistas, as minorias e todos que, de algum modo, poderiam representar uma resistência ao regime nazista. Tratava-se de um "outro inconveniente" a ser culpado por aquilo que dificultava uma realização plena.

O relativo pacifismo da sociedade brasileira se origina na submissão e no impedimento de que aqueles que não são beneficiados se organizem e expressem suas demandas. A cordialidade aparente do sujeito desaparece quando o meio que lhe faz colocar a máscara da polidez, a sociedade, não lhe proporciona a proteção e a estabilidade que ele espera. Assim, a bestialidade humana aflora, e a cordialidade dá lugar à sede por vingança. De preferência, no âmbito público.

A fragilidade de nossas instituições e a descrença na capacidade do Estado em cumprir o seu papel como regulador das práticas sociais, gera o sentimento de que algo precisa ser feito e com urgência; se as instâncias que deveriam zelar pela ordem não o fazem, alguém precisa tomar as rédeas. Onde não há justiça, reina a vingança. Ampliam-se os caminhos para a intolerância, o medo e a insensatez.

Este ambiente de incertezas que o Brasil vive acaba sendo uma fotografia daquilo que faz parte do cotidiano. É gente que bate-boca nas redes sociais, que difunde mentiras e que ao ofender o outro ainda é aplaudida. É o policial que quebra o cassetete na cabeça de algum estudante e passa a ser visto como herói. É, também, por óbvio, o político que tudo promete, mas que ao longo de sua história nada fez pela população. Quando não há mais espaço para o diálogo ou o respeito para com o diferente, quando o impulso se sobrepõe à racionalidade e as leis, já não basta estar alerta, é preciso que algo mais seja feito.

Nenhum comentário:

Postar um comentário