Diante
daquilo que tenho visto, resta-me a inabalável percepção de que o mundo sempre andou
dividido entre pessoas que pensam apenas nelas mesmas e aquelas que buscam
meios para minimizar a desgraça dos outros. Vivemos um tempo no qual as informações
deturpadas impedem a divulgação das melhores virtudes para uma sociedade mais
justa. Em minha consciência crítica, não pretendo cair no maniqueísmo, e, por
isso, digo que se trata de uma luta da solidariedade contra o egoísmo.
Acredito
que o mundo já tenha sido pior, mesmo que para alguns o saudosismo seja a
palavra de reverência diante das desventuras do cotidiano. Basta uma espiada
nos percursos da história para vermos que a guerra foi uma constante na
dominação de territórios, sendo escravizados os vencidos, quando não exterminados;
a servidão foi base para a economia no passado; as invasões de outros
continentes redundaram em genocídios de milhões. Por conta da ganância,
erguemos muros e demarcamos fronteiras.
É
preciso seguir acreditando. Esforçar-se para que, ao menos, as pessoas tenham
as mesmas oportunidades. Que os filhos da empregada doméstica tenham as mesmas
oportunidades que os filhos do empresário bem-sucedido. Cabe a todos e todas,
vencer este trágico determinismo de uma sociedade profundamente injusta e
indiferente à dor dos outros. Que parece estar se acostumando a ser indiferente
quando uma criança morre nos braços da mãe por conta da falta de tratamento
médico, enquanto outros jogam “dinheiro pelo ralo” em baboseiras e sem qualquer
melindre ético ou moral.
A
história nos mostra as múltiplas facetas da opressão, exploração e dominação.
Quem possui as prerrogativas do poder econômico também consegue a maioria dos
instrumentos de coerção e persuasão. Poucas vezes, quem sofre na carne as
injustiças, possui o discernimento crítico para entender as artimanhas e o jogo
do poder. Vive-se na ilusão e acredita-se em qualquer coisa. Talvez a grande
tragédia seja, justamente, não perceber que caminhamos a passos largos para
consolidar uma sociedade que, a cada dia, subverte a solidariedade, esquece a
compaixão e desdenha da igualdade. Achamos “normal” a competição, a
concorrência, o individualismo, o egoísmo e a indiferença para com a dor
alheia. Aplausos para o triunfo dos mais espertos!
Antes
que alguém ouse “carimbar” estas minhas ponderações, digo que elas não estão
alinhadas com alguma ideologia política ou partidária, em particular. São,
antes, afirmações de quem não se conforma com a tragédia humana em uma
sociedade que relega, por exemplo, crianças e adolescentes a procurar comida no
lixo e mães que não tem outra escolha que não seja a de assistir, passivas,
seus filhos e filhas morrendo refém das drogas e da mais abjeta violência. Não
consigo aceitar, em nome dos valores que sempre ousei defender, que a miséria
não cause mais indignação e revolta do que a subtração de privilégios.
Às
vezes, por conta de tanta coisa que anda acontecendo, bate um desânimo e até certo
desencanto com a raça humana. Ficamos tentados a pensar que as coisas não têm
jeito e que a luta é inglória. Que as nossas aspirações de justiça e equidade contrariam
a “natureza das coisas”. Ingenuidade seria, pois, acreditar em uma sociedade
igualitária, baseada na solidariedade e no bem comum. Não podemos, no entanto,
desistir. É preciso manter a esperança e lutar para que ela, ao menos, oriente
a nossa caminhada.
É
preciso resistir e não dobrar-se a tantos absurdos que, todos os dias, vivenciamos.
É indispensável recuperar alguns valores para orientar os caminhos tortuosos do
presente e inspirar as futuras gerações. Continuo acreditando, mesmo que às
vezes o desânimo seja perverso e a luta inglória, que uma nova sociedade, um
novo tempo e uma nova consciência, são princípios inalienáveis. Afinal, como
preconizou Eduardo Galeano: a utopia é
como o horizonte, está sempre distante, mas é o que nos faz caminhar.
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