Os seres humanos são sabedores de que o
passado tem a força de reviver momentos da jornada. Confrontar sonhos que foram
aniquilados e idealismos que não puderam subsistir. Toda a vida não passa de um
sopro ligeiro. Somos parte de uma realidade sublinhada por dois sentimentos, a
esperança e o medo. A imprevisibilidade que a esperança suscita, anima, mas o
futuro indeterminado é capaz de amedrontar.
Fiódor Dostoiévski, um dos maiores
romancistas da literatura russa, conhecido pela obra “Os Irmãos Karamazov”,
escrita no ano de 1880, soube reconhecer: Somos
assim: sonhamos o voo, mas tememos as alturas. Para voar é preciso ter coragem
para enfrentar o terror do vazio. Porque é só no vazio que o voo acontece. O
vazio é o espaço da liberdade, a ausência de certezas. Mas é isso que tememos:
o não ter certezas. Por isso, trocamos o voo por gaiolas. As gaiolas são o
lugar onde as certezas moram.
Na memória, perduram as lembranças das
adversidades e a trágica sina que embota os sentidos daquilo que, sendo belo,
consegue ser contemplado apenas na saudade. O dever de seguir adiante vira um
imperativo. Os vendavais não são motivo de orgulho. A vida vai ficando cada vez
mais curta. Têm dias em que nos esforçamos para remontar o passado com o
intuito de preservá-lo antes que desapareça como fotografia corroída pelas
intempéries. Ansiamos em garimpar, no abismo mais profundo de nossa memória, o
que trouxe alegria e realização.
Precisamos do coração aberto e da alma leve
para desfrutar com um pouco de sabedoria os instantes que nos foram concedidos
nesta vida fugaz. Uma pena que a efemeridade da vida seja tão negligenciada e o
nosso labor constitutivo daquilo que mal sabemos aonde possa estar levando. As
excentricidades do mundo vão esmagando sonhos. A coerência nem sempre antecipa
dias amenos. Idealismos não garantem a humanização. Os vendavais não são motivo
de orgulho. A vida vai ficando cada vez mais curta.
Assim como o mar toca a praia e arrasta, em
seu movimento infindável, sonhos e utopias, também sela destinos, desconstrói
devaneios e não toma conhecimento dos murmúrios e das inconstâncias da alma
humana. O imperativo da modernidade pragmática em querer explicar, compreender
e dominar os mistérios do coração é ridículo. A despeito das aflições, os
caminhos do porvir permanecem imperscrutáveis na sua infinita maioria.
Se quisermos encontrar o caminho da partilha,
da atenção, do cuidado, é imprescindível exercitar a sensibilidade, o tato, o
carinho. Não há respostas prontas para amenizar os sofrimentos da caminhada. Em
nossos medos existenciais, alimentamos angústias, deliberadas ou não. Tudo o
que sabemos e que já pôde ser alcançado não é capaz de garantir o amanhã. A
cada passo, vamos esmiuçando caminhos e dilemas. É preciso manter-se atento
para o inesperado.
Não nos damos conta que, poucas vezes,
haveremos de ter duas chances na vida. O pulsar do coração avisa, mesmo sem
querer, que o tempo é como a areia que escorre por entre os dedos. Nosso
fôlego, a cada minuto, se esvai. Por isso, ser amado, ser cuidado, ser
compreendido pelo que somos, com nossas virtudes e precariedades, é a maior
conquista que se possa merecer nesta caminhada.
Após
cumprirmos o destino de nossa existência, restará o quê? Quais vestígios se
conservarão da nossa passagem pelo mundo? Que tipo de lembrança haveremos de
perpetuar na memória de quem encontramos pela estrada? Sobrarão feitos, gestos,
palavras ou algo que valha comentar? Será que houve sensibilidade, gentileza, busca
por justiça e alento na dor naqueles que nos foram presenteados? Qual o sentido
do ativismo insano ao construirmos nossa essência na indiferença para com a dor
e o sofrimento do outro?
A história interior de cada indivíduo
continua sendo um horizonte obscuro e difícil de ser decifrado, mas ter pessoas
que nos acolham pelo que somos, sem máscaras ou adereços, é um presente
incomensurável. Afinal de contas, nossas descobertas são provisórias, nossos
acertos, frágeis e nossas certezas, relativas.
Bom dia, cheguei ao seu blog através de minha amiga Liria Andrioli e estou gostando dos textos, especialmente este que me remeteu a reflexões importantes. Voltarei a visitar o blog. Desculpe não sei o que aconteceu, estou com dificuldade para postar com a conta google. Meu nome é Ana Maria e sou de Santa Rosa.
ResponderExcluirAntes esqueci de mencionar que a Liria me recomendou a leitua de "Percursos da Alma". Como tenho acesso a esse livro? Obrigada. Ana Maria
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