sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Vivências, Ausências, Flores e Jardins.



O jardineiro sabe e sente. Ama as flores e cuida de cada detalhe, por saber que não há, verdadeiramente, beleza e amor fora da experiência do cuidado. A cada dia, dialoga com as suas flores. Sabe identificar que a ausência delas não significa apenas um vazio, mas o repouso do preparo. Por isso, quem não souber viver o silêncio do recolhimento nunca saberá o significado do florescer.
Nesta nossa efêmera jornada, a cada dia, somos desafiados a compreender o caminho das pedras. Descobrir que as roseiras não dão flores fora do tempo, nem sem o cuidado para o cultivo. Cada roseira tem seu estatuto, suas regras, seu tempo. A vida requer cuidados. Flores e espinhos são belezas que andam juntas. Não sabem viver sozinhas.

O coração tem o seu próprio compasso. O ciclo da existência nos impulsiona para lugares e momentos desconhecidos neste mundo conturbado. Não há resolução mágica que possa nos salvar das inconstâncias e dos desencantos. Nesta estrada a vida passa tão depressa, semelhante ao vento.

Ninguém é capaz de saber o que é a felicidade sem que não tenha antes passado pela decepção. Só pode desfrutar de alguma vitória aquele que já sentiu o amargo da derrota. O avesso é repleto de ensinamentos. Consertar o que posso ter estragado, mesmo sem querer. Dar sentido ao perdão que não exercitei. A solidão que não desfiz. O sorriso que ficou escondido.

Há pessoas que, infelizmente, passam a vida dando palpites e receitas para os outros. Talvez o façam por não serem capaz de viver a própria existência com equilíbrio. Preferem ser especialistas em receitas mágicas de felicidade e de realização. Não percebem entraves éticos ou morais ao recomendarem o que eles próprios não concretizam na sua história de vida. Vão ferindo porque não souberam lidar com os percalços que encontraram nos seus caminhos. Prenderam a atenção nas palavras agressivas e acreditaram no conteúdo mentiroso delas.

Quantas vezes busca-se a ilusão de viver para poder esquecer. Ao não alcançar aquilo que almejamos, vamos vendo a vida pelos avessos. A maturidade faz com que percebamos que talvez sejamos pequenos para mudar algumas situações. Que determinadas circunstâncias apenas trazem dor, saudade, lamento. Olhar com maturidade e discernimento para a vida pode ser mais lento do que desejaríamos e mais difícil do que suportamos.

É um caminho que se faz caminhando. Jornada que acontece ao ser demandada pelo esforço, pela insistência, pela vontade em superar a dor das ausências. Tem dias onde reconhecemo-nos em alto mar. Cativos do que não soubemos compreender. Prisioneiros de nossas culpas. Aprisionados pelas nossas escolhas, deliberadas ou não. Mas, talvez o mais importante seja saber, que em algum lugar e de alguma forma, devemos seguir atravessando os desertos que se agigantam em nosso porvir.

É preciso muita sabedoria e perseverança para não ser aniquilado pelo peso dos desencontros. Afinal, vivenciamos a cada dia a disputa de, pelo menos, três tempos. O passado, com sua facilidade em nos imputar culpas e remorsos, tornando a vida um eterno tribunal, cujo julgamento nunca poderá nos conceder uma sentença satisfatória. O presente, com suas inapeláveis intempéries que nos cegam, com urgências e sentidos que nos privam daquelas escolhas que tanto gostaríamos de alcançar. E o futuro, esse misterioso e sinistro portador de esperanças imprecisas e certezas obscuras.

Receio que seja um imperativo para a existência não perder de vista aquilo que escolhemos para perpetuar em nosso tempo aqui no mundo. Cuidar para que não sejamos feridos por aqueles que justificam os meios para alcançar um determinado fim. Com aqueles que se moldam na petulância, na mesquinhez, na falta de humildade. É preciso ter cuidado com os que semeiam maldades e que se escondem em sorrisos caricatos e sedutores.

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