Qual o mistério encarnado
em Jesus de Nazaré? Por que ele continua nos lábios de quem o confessa, na
súplica dos doentes e no grito de esperança dos
sonhadores? Passados tantos séculos, a história do filho de um singelo carpinteiro
e de uma camponesa ainda adolescente continua a despertar sentidos e
sentimentos. História de alguém que não deixou uma só linha escrita para a
posteridade, não arregimentou nenhum soldado, não conquistou nenhuma cidade
pela imposição da força, mas que foi o protagonista de uma das maiores
transformações de todos os tempos.
Que verdades este
andarilho soube divulgar? Como ousou acolher quem a sociedade rejeitava? O que
fez para despertar a ira das poderosas elites de seu tempo? Como conseguiu
conciliar em um só grupo, pescadores sem qualquer instrução e opositores ao império
romano? Como gente tão simples conseguiu ser força transformadora das mais
incisivas? Como compreender que tenha sido capaz de acolher com afeto e carinho
os mais humildes, as crianças, as viúvas, os doentes, as mulheres condenadas
pela lei mosaica?
São questionamentos que
ultrapassam deduções elementares e continuam a intrigar historiadores,
confundir filósofos e a perturbar aqueles e aquelas que almejam compreender
seus ensinamentos de forma crítica. Talvez nunca consigamos responder a muitas
destas indagações. O homem nascido na minúscula e longínqua Belém continua sendo
a inspiração para milhões de pessoas. É o tema recorrente nas canções infantis.
A inspiração dos combalidos. O auxílio para quem é confrontado com as
desventuras da jornada.
As diferentes expressões
religiosas na face da terra sempre buscaram narrar, cada qual à sua maneira,
aquilo que ligava os seres humanos com a sua divindade. No entanto, sem
qualquer precedente histórico, a narrativa cristã foi forjada nos termos da simplicidade.
Jesus não nasce de modo espetacular. Numa noite qualquer, que jamais poderá ser
descortinada com precisão em qualquer calendário, alguns cuidadores de ovelhas percebem
o aviso das estrelas na madrugada.
A história do menino
nascido na Galileia poderia ser a história de tantos que nascem sem ter um
lugar e que tem de experimentar a vida dura marcada pelo preconceito, pela pobreza,
pela falta de dignidade. Em sua missão, jamais impôs, jamais buscou a força,
jamais buscou submeter quem lhe era diferente. Sua intenção foi a de partilhar
as dores, celebrar as alegrias, inspirar a busca por justiça e fazer o bem. Em
palavras e atitudes, foi o alivio para quem estava fatigado. A mão estendida
para quem havia caído. O alento nas lágrimas. Sua verdadeira e maior glória: lavar
os pés de seus amigos.
Que bom que uma vez por
ano, pelo menos, acendemos luzes e, de alguma forma, nos conectamos ao Deus
menino, que não abriga qualquer sombra em seu exemplo. Nas nossas ambiguidades
e diante do convívio cada vez mais precário, é o espírito do natal que induz e
inspira para gestos de candura em meio aos dilemas da existência. Pelo menos,
por algumas horas, há um esforço para deixar de lado a escuridão triste e
dissimulada que tende a reinar sobre a humanidade. Pelo menos, por algum tempo,
somos capazes de escrever ou pronunciar votos de alegria, reanimando a
esperança e apostando na grandeza dos nossos semelhantes.
Ao celebrarmos o Deus
menino, festejamos a fragilidade do bebê que dependeu dos braços maternos para
sobreviver. Esvaziado, humilde e carente, Deus se revelou à humanidade numa
estrebaria. Este homem mostrou ser possível rejeitar um sistema corrompido sem
insuflar o ódio. Jesus é a metáfora para uma humanidade indiferente. Ele,
apesar de tudo e a despeito daquilo que sugere a negação aos seus ideais,
continua sendo conselheiro, príncipe da paz, o escolhido entre milhares para redimir
a todos e todas.
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