sexta-feira, 15 de abril de 2016

TEMPOS OBSCUROS



Vivemos um dos momentos mais conturbados da história social e politica brasileira. Um período que, guardadas as devidas proporções, não deixa de ser parecido com aquele que antecedeu uma das nossas dissenções recentes com os governos militares. Um tempo de exacerbação sectária e separatista. Um momento no qual se multiplicam as aberrações constitucionais. Em nome de um suposto combate à corrupção, mascaram-se as verdadeiras razões políticas, ideológicas e econômicas. É neste cenário de pouco diálogo e falta de clareza histórica que o ódio, a intolerância e o maniqueísmo são potencializados.

A violência verbal escancarada nas mídias sociais vai migrando para as ruas sem que haja preocupação pela plausibilidade daquilo que é defendido. Já faz tempo que uma boa parcela do mundo acadêmico, por exemplo, deixou de lado o combate a tantas aberrações extravagantes que vemos e ouvimos diariamente. Aliás, talvez tenhamos até um movimento ao contrário. Prega-se abertamente a balbúrdia e tolhe-se a vontade de diálogo a partir das diferenças. Busca-se uma sinfonia de uma nota apenas.

Tenho visto centenas aplaudindo abertamente a volta de um estado de exceção. Gente sendo atacada por defender determinadas ideias ou valores da cidadania. Pessoas sendo desqualificadas na sua idoneidade moral por questionar determinadas prerrogativas políticas. Opinião diferente sendo interpretada como salvo conduto para justificar ataques e ofensas. O outro como aquele que deveria ser esmagado, e, de preferência, proscrito.

A tal cordialidade brasileira, como a descreveu o grande historiador Sérgio Buarque de Holanda, ao que parece, hoje, anda distante, pois cedeu o seu lugar para o ódio e a intolerância de modo a antecipar caminhos muito difíceis no porvir. Já estamos acostumados. Primeiro a desqualificação, os ataques pessoais, as piadas infames, depois alguma justificativa, ainda que pouco factível.

O que menos importa é a busca de uma suposta verdade. A coerência, o bom senso e a justiça. Quem se atreve a questionar, com facilidade, é enquadrado em alguma posição dicotômica e binária ‘a favor’ ou ‘contra’ de quem defende sua posição política, ideológica, moral ou religiosa. Seria salutar compreender que tanto com o avanço conservador de quem não suporta o debate ou os meandros de um liberalismo que nada mais deseja do que o poder para consolidar restrições sociais, o caminho é sempre o mesmo. Um estado democrático não de direitos, mas de privilégios.

Enquanto no Brasil não soubermos dialogar a partir das diferenças e sem infinitos subterfúgios ideológicos mesquinhos, a democracia continuará sendo um conceito abstrato onde a maior parte da população seguirá à margem das decisões. Não me surpreende que, para alguns, o caminho da belicosidade seja a única alternativa plausível. Mas o que me assusta mesmo é ver esta nação andando por atalhos onde setores do judiciário, da elite política e midiática, tomam suas decisões sem importar-se com as consequências ao alimentar os acirramentos que vem se multiplicando.

Quando o caldo entornar de vez, cada um precisará pagar a sua cota neste país à deriva por conta desta sanha insana pelo poder. Por enquanto, uma grande parcela comemora, porque, aparentemente, manipula as regras do jogo. Em breve, talvez, surgirão aqueles e aquelas que vão perceber que quem apanha sem parar não esquece jamais quem são os algozes. A história vai dar o troco. Disso não tenho dúvidas. Receio, contudo, que possa ser tarde demais.

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