Sou
contra toda forma de corrupção e não fui para as ruas mesmo não acreditando na
inocência do Lula ou na pureza do seu partido. Eu não fui e jamais irei para
estar ao lado de pessoas que se afinam com pautas mesquinhas, conservadoras e
oportunistas. Pessoas que com a desculpa de estarem preocupadas com a corrupção
querem restringir direitos conquistados.
Não
fui às ruas porque essa revolta, ainda que com grande adesão, é seletiva. Esse
protesto não foi apenas sobre a corrupção. Se fosse, veríamos gritos e
protestos contra Aécio, Alckmin, Temer, Cunha, Calheiros, Serra, FHC e mais
algumas centenas de políticos. Não fui às ruas por compreender que uma faixa
dizendo "queremos que todos os partidos políticos respondam por seus
atos" não representa um real desejo de justiça e igualdade. A corrupção
não é novidade. Jesus Cristo que o diga.
Certamente
ela não é novidade para quem cresceu sem saneamento básico e asfalto porque a
verba nunca chegou. Ela não é novidade para quem não teve acesso à educação
básica e à saúde. Muito menos para os que vivem sem água no sertão ou para os
que morrem todos os anos nas enchentes. Não nos enganemos dizendo que a revolta
é com o nível absurdo de corrupção. Ela está aí, perversamente, corroendo
o Brasil há séculos.
Eu
não fui às ruas, mas iria se aqueles que estivessem ao meu lado não fizessem
vista grossa a quem massacra os professores. Eu não fui, mas iria se a situação
da saúde e da segurança aqui no Rio Grande do Sul, por exemplo, fosse tratada
sem subterfúgios ideológicos. Eu não fui, mas iria se a pauta fosse para limpar
o Congresso de Cunhas, Bolsonaros e Felicianos que só sabem culpar
homossexuais, negros e mulheres, vítimas de violência, roubando-lhes os poucos
direitos conquistados.
Eu
não fui, mas iria se muitos dos que hoje gritam para limpar o Brasil, não
fossem cegos e surdos para a desfaçatez cometida em mais de duas décadas de
ditadura. Eu não fui, mas iria se não precisasse tirar fotos com amigos
vestindo a camisa da seleção brasileira que representa uma das instituições
mais corruptas do Brasil e do mundo.
Eu
não fui às ruas pedir o fim da corrupção ao lado de pessoas que, em muitos
casos, não pagam seus impostos. Eu não fui às ruas com quem apoia a redução da
maioridade penal e jamais, nem por decreto, iria para a rua com quem acredita
que um país com tantas desigualdades como o nosso está assim apenas por culpa
de um governo e de um partido.
Eu
não fui às ruas celebrar o Moro ou o MPF que se acham "paladinos da
justiça" quando estão, com ressalvas, cumprindo o seu dever. Os fins
continuam não justificando os meios. Pode se tratar do Lula, de Cunha, de
qualquer pessoa, não faz diferença. Eu estarei disposto a ir para a rua quando
houver uma mudança de valores e não apenas estardalhaço para alguns
conquistarem o poder puxando o tapete dos outros.
Não
fui às ruas para defender um juiz que nunca foi e nem será um exemplo ou herói.
Não consigo acreditar em alguém que interpreta a constituição de forma
insólita, recebe ganhos exorbitantes e prega uma moralidade meio estrábica. Não
posso me juntar com quem continua perpetuando o discurso de ódio e culpando os
outros pelos problemas sem mover uma vírgula para resolvê-los. Essa discussão
sempre foi e continuará sendo inócua. Leva do nada para lugar nenhum.
Chamar
o cidadão de "coxinha" não vai mudar a história. Culpar os
empresários que pagam impostos e geram empregos, também não. Ajuda muito
menos aquele que defende o governo com unhas e dentes sem enxergar
incoerências, sem se dar conta de que o próprio governo não soube corrigir as
distorções históricas fazendo alianças com gente que não merecia o lugar que
ocupa.
Mesmo
não indo para a rua, acredito que os protestos são um meio legitimo para
manifestar insatisfação. Sei que nem todos que foram acreditam em tudo aquilo
que fez parte das reinvindicações. De igual forma, também penso que muitos dos
que ficaram em suas casas são pessoas que vivem a ilusão que os faz cegos pela
ideologia.
Já
fui tantas vezes para as ruas para protestar e não deixarei de ir quando
estiver convencido em saber quem estará ao meu lado e quais as causas que
estarão sendo reivindicadas. Como podemos acreditar que o impeachment haverá de
resolver o problema quando TODOS os partidos estão afogados no lamaçal?
A
única coisa que pode iniciar uma mudança é a coerência. Olhar para nós mesmos,
depois para os outros, com respeito e empatia. É ler, estudar, conhecer um
pouco de nossa própria história, votar com consciência, depois ir para as ruas
e cobrar aquilo que é justo e decente. Talvez o maior problema do Brasil nem
seja a corrupção. O maior problema do Brasil é o individualismo que redunda na
vergonhosa desigualdade social. A corrupção é apenas um sintoma que multiplica
uma causa muito mais vulgar, muito mais vergonhosa, muito mais podre.
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