terça-feira, 10 de julho de 2018

OS NÚMEROS DA VIOLÊNCIA


Há poucos dias foram publicadas duas importantes pesquisas acerca da violência nas cidades e no campo no Brasil. O Atlas da Violência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e o Caderno de Conflitos no Campo em 2017, da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Os dois estudos revelam um aumento gigantesco da violência e das mortes pelo país afora. Além de indicar as regiões, os estados, as faixas etárias, circunstâncias e fatores, as pesquisas apontam também quem são os homens e as mulheres mais atingidos: os moradores das periferias, os jovens negros, mulheres camponesas, indígenas e quilombolas, moradores ribeirinhos em localidades de conflito com grandes empreendimentos.

É importante observar que os dados institucionais, como os trazidos pelo Atlas da Violência, apesar de ter números alarmantes, ainda não conseguem dar conta de uma realidade onde são comuns as muitas violências cometidas pelo Estado quando este se ausenta em solucionar os conflitos. Os estudos colocam o ano de 2017 como de maior número de assassinatos no campo dos últimos 20 anos. São constatações preocupantes em um cenário onde as pessoas percebem a crescente violência vivida em todas as regiões do país.

A população negra e pobre, por exemplo, é a que mais morre nas cidades brasileiras. A taxa de homicídios entre negros cresceu quase 30% nos últimos 10 anos. No mesmo período, a taxa entre os não negros teve uma redução de quase 10%. A taxa de homicídios de mulheres negras foi de quase 80% superior à de mulheres não negras. Nos últimos dez anos, a taxa de homicídios para cada 100 mil mulheres negras aumentou por volta de 20%, enquanto que entre as não negras houve queda de 10%.

O estudo do IPEA chama de juventude perdida o conjunto de dados e violências que revelam o aumento sobre a população com a faixa etária entre os 15 e os 29 anos, destacando que, entre homens de 15 a 19 anos, os homicídios são a causa da morte de 60%. Sergipe é o estado que tem o maior número de mortes de jovens no país. Para cada 100 mil, 65% são jovens. De modo geral, as violências contra a população negra (pretos ou pardos) aumentou em quase 30% nos últimos 10 anos.

Sobre a violência contra as mulheres, os dados demonstram que os homicídios, feminicídios e estupros, podem ser fruto de processos violentos visíveis e também não visíveis, como a violência psicológica, a patrimonial, a física e sexual. Quase 70% dos registros são de estupros com menores de idade (até 13 anos). Isso revela como a violência doméstica e familiar também tem crescido, pois os agressores são, em sua maioria, pessoas do convívio mais próximo, como, por exemplo, os pais e os padrastos. Trata-se de uma violência recorrente e que, em geral, ocorre nas casas das crianças.

Houve um aumento assustador relacionado à violência no campo. As tentativas de assassinatos subiram quase 70% e as ameaças de morte 20%. O número de conflitos apenas em 2017 foi de quase 1.500. Isso corresponde a um assassinato para cada 20 conflitos, ou então, um a cada três dias. Os relatos dos acontecimentos pontuam altos níveis de brutalidade. Afora isso, o que fez o ano passado ser diferente, foi uma incidência de massacres. Ocorreram, pelo menos, cinco massacres com mais de 30 vítimas.
Ao trazer os dados destes dois documentos, o que fica em termos de reflexão e aprendizado é a evidência de que tanto no campo como na cidade, a impunidade segue como um dos pilares que sustenta a violência. O Estado não é quem atira ou executa em primeiro plano, mas, aquele que nega políticas públicas e a efetiva resolução jurídica justa e necessária. É imperioso desnaturalizar tanta violência e encarar este assunto como responsabilidade pública e de interesse da sociedade. Cobrar o enfrentamento não apenas das consequências, mas, sobretudo, das causas por conta da ausência de ações que garantam a inclusão e a cidadania em sua plenitude.

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