sexta-feira, 6 de abril de 2018

As Nuances do Ódio


A onda de manifestações absurdas que se seguiu ao assassinato da ativista carioca, Marielle Franco, não surgiu de forma aleatória ou espontânea. Foi organizada por grupos que aproveitaram a oportunidade para multiplicar barbaridades. O escritor búlgaro e Prêmio Nobel de Literatura, Elias Canetti, refere em uma de suas principais obras - Massa e Poder - que as pessoas são capazes de recolher os ódios que estão na sociedade e instrumentalizá-lo para destruir a reputação e a história dos seus semelhantes. Canetti busca decifrar os sentidos que leva pessoas a se transformarem em uma coletividade enfurecida cheia de paranoia, medo e voracidade. Quem manda e quem obedece? Quem deve ser exterminado e quem deve viver? Como se alcança e se perde o poder?

Trata-se de algo que existiu no nazismo, por exemplo, mas que continua se proliferando nos dias atuais. Indivíduos que aparecem como se fossem pessoas boas, mas, que na verdade, querem mesmo multiplicar os sentidos da obscuridade. Não conseguem assimilar a diversidade humana presente em diferentes percepções ideológicas, sociais ou religiosas. Gente que tem problemas sérios na sua relação com a ética e com os valores pautados pela democracia. Tem prazer em aniquilar o outro e gostam de se entender como administradores de uma suposta verdade com caráter absoluto. 

Nas sociedades medievais, eram os monges que representavam as estruturas de massa. Eram eles que organizavam os grupos mais vulneráveis com vistas ao controle da Igreja e do governo. Em todos os movimentos autocráticos, sempre existiram, de forma estratégica, certos protagonistas. Pessoas que eram capazes de recolher os anseios presentes na sociedade para que fossem dirigidos a determinados grupos, de modo a destruí-los. Nunca existiu um sentido de espontaneidade. O que houve foram grupos pautando um principio de organização e incidência em relação a outros. Um desdobramento desta compreensão são as organizações político partidárias.

Somos uma sociedade na qual a estrutura dos relacionamentos entre as pessoas é sublinhada, em grande medida, pelos meandros da força e da violência. Os direitos existindo para alguns de forma mais incisiva e sendo negado para uma esmagadora maioria. Numa sociedade democrática deveria existir uma autoridade capaz de mediar não só os conflitos, mas também se fazer respeitar. Quando não há esta premissa, a violência e o caos tendem a se multiplicar. Ouso afirmar que esta parece ser a realidade presente em nosso país nos dias atuais.

É preciso muita capacidade para compreender o momento que o Brasil atravessa. É primordial, sobretudo, o conhecimento de nossa história para descortinar caminhos de transformação e esperança. No fundo, as grandes crises, apenas mostram de forma mais evidente uma fotografia daquilo que nos move em nosso cotidiano. Nossos valores, nossos princípios, nossas utopias. Se bem observarmos, veremos que o ódio é também um gesto de desespero no âmbito de uma sociedade conturbada e sem grandes referências ou preceitos éticos.

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