sábado, 17 de fevereiro de 2018

QUE TEMPOS SÃO ESTES?



Vivemos em um dos períodos mais conturbados de nossa história. A massa reacionária que andava meio escondida, de repente, resolveu adotar a censura, ameaça e agressão como instrumentos de intimidação. O nosso congresso é uma vergonha. A grande mídia se transformou em ultraje à dignidade humana e as instituições jurídicas, faz um bom tempo, resolveram escamotear qualquer resquício de sensatez ou equidade. Muitos, em completa ignorância, tagarelam mundos e fundos sobre coisas que não conhecem e, sem qualquer controle, multiplicam bobagens sem eira e nem beira, principalmente nas redes sociais.

Tenho visto, com tristeza, certos grupos religiosos reafirmando posicionamentos recheados de preconceito e intolerância. Isso me faz pensar que se Jesus ousasse voltar, correria o risco de ser mais esculachado do que na sua época. Uma boa parcela da sociedade não consegue exercitar uma das premissas elementares da convivência humana - o diálogo. Se Cristo quisesse defender as mesmas ideias das escrituras sagradas ou decidisse andar ao lado das mesmas pessoas com os quais andou, não tenho dúvidas que acabaria humilhado, atacado, surrado, morto outra vez em nome de uma pretensa moralidade.

O inacreditável nesta história é que, considerando que Jesus foi um idealista em sua época, se voltasse, seria tudo aquilo que é considerado inferior, marginal e blasfemo. É muito provável que seria chamado de preguiçoso, vagabundo, subversivo, destruidor das famílias e dos bons costumes. Não tenho dúvidas de que levaria muita porrada de quem acredita ser ungido de Deus. É possível que fosse condenado em nome da fé e das tradições para aplausos de quem vive alardeando que podemos resolver nossas mazelas na base da paulada.

Se Jesus aqui estivesse, sofreria muito na mão dos que hoje se autoproclamam sacerdotes e pretensos representantes dos interesses de Deus na terra. Que afirmam lutar pelo direito de expressarem suas crenças, quando advogam, na verdade, o privilégio de vomitar seu ódio diante daquilo que supõe ameaçar o controle sobre o povo.

O discurso de ódio e de intolerância está na boca de muita gente, mesmo que seja de forma indireta ou “inocente”. É nas redes sociais onde se alardeia abobrinhas ao falar que a solução para tudo é mais bala, mais armas, mais sangue, mais matanças. Aceitam-se com naturalidade programas sensacionalistas marcados por respostas simplórias e que apelam para aquilo que mesmo não tendo funcionado em lugar algum do planeta, aparenta ser o melhor caminho. Quem hoje se dispõe a levantar a bandeira do diálogo, da paz, da tolerância, tem muitas chances de ser visto como defensor daquilo que não edifica.

Não dá para dizer para uma pessoa que defende a matança de meio mundo que ela não entendeu nada do que Jesus ensinou. Poderia parecer arrogante ou ofensivo. Mas é fato incontestável que palavras de tolerância, compreensão e amor, orientam os princípios bíblicos contidos, por exemplo, no Novo Testamento. Se por muito tempo pessoas foram levadas à fogueira, hoje se insiste em coisas absurdas com a falsa premissa de que a Palavra de Deus poderia justificá-las. Parece que não aprendemos nada com a história.

Liberdade de expressão, de fato, não é algo absoluto. Seu abuso deve ser questionado ou punido quando suscita a violência contra as pessoas. Conviria refletir melhor sobre quem está fomentando a violência no Brasil hoje? Por acaso são os arautos de uma pseudomoralidade que dizem que apenas alguns são filhos de Deus ou alguma representação artística que pede o fim dessas barreiras?

Não estou dizendo que devemos seguir a lógica franciscana ou, então, sermos indiferentes em relação aos que sofrem. No entanto, é preciso entender o que acontece na nossa sociedade para encontrar caminhos que possam modificar a lógica que anda impregnada no cotidiano de nossas relações. É preciso perceber que ninguém é melhor do que ninguém apenas porque se sente moralmente superior em uma sociedade marcada de forma cruel por infinitas injustiças. Uma sociedade de profundas desigualdades geradoras de todo tipo de violência.

Enquanto o Brasil vai sendo aniquilado pela mais abjeta canalhice nas altas esferas do poder, exércitos de pessoas que não têm o que fazer e, talvez por isso, gastam tanto tempo para ofender, criando factoides e fofocas, que em nada contribuem para um mundo melhor. É preciso pensar e compreender o Brasil no qual vivemos porque esse é o nosso dever histórico. Acreditar que o diálogo respeitoso, franco e sem subterfúgios, sempre haverá de ser o melhor caminho para a nossa jornada.

Uma coisa é certa. Se pudéssemos interpretar de uma forma mais profunda o que significa amar os semelhantes como a nós mesmos, dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus, entenderíamos que muito do que se vive nos dias atuais poderia ser bem diferente. Afinal de contas, o que significa mesmo seguir o exemplo do peregrino de Nazaré? O autor do Evangelho de Lucas, capítulo 23, versículo 34, atesta: ''Pai, perdoa. Eles não sabem o que fazem''. Eu, humildemente, acrescentaria: “há muitos que também não sabem o que falam”.

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