terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

Corruptos

O Padre Jesuíta Antônio Vieira, em um sermão dedicado à festa de Santo Antônio, no longínquo ano de 1654, indagava: "O efeito do sal é impedir a corrupção, mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção?" No seu entendimento, havia duas causas principais para a corrupção: a contradição de quem deveria salgar e a incredulidade do povo diante de tantos atos que não correspondiam às palavras.

Tenho para mim que o corrupto nunca se admite como tal. Sempre metido a esperto, vai sendo movido pela ambição desenfreada. Não é propriamente um ladrão. Antes, trata-se de um requintado chantagista. Destes que fica por aí com uma conversinha mole, sorrisinho amável, trejeitos gentis.

O corrupto, em geral, não gosta de se expor. Considera a comissão ou o lucro fácil um direito que ele fez por merecer. Acha que uma gorda porcentagem oferecida para alguém que já esteja com a corda no pescoço é apenas um pagamento por seus supostos serviços.

É capaz de falar poucas e boas sobre os desvios da esfera pública, mas quando tem a oportunidade de tirar uma casquinha em algum negócio escuso, não hesita em considerar a sua atitude como adequada e até legal. Bobos são aqueles que não aproveitam as oportunidades para obter vantagens.

Há muitos tipos de corruptos. O corrupto de carteirinha é aquele que se vale de uma função pública para tirar proveito para ele, sua família e os amigos. Pega o carro do serviço para ir ao supermercado ou cinema, leva a esposa para alguma viagem de avião paga pelo erário público e não pensa duas vezes ao falsificar notas de almoço ou jantar.

A lógica do corrupto é mais ou menos a seguinte: "Se eu não fizer, haverá outro que fará no meu lugar". Talvez o único temor de quem segue práticas espúrias é ser apanhado em flagrante. A pessoa não se envergonha de olhar no espelho, apenas teme ver seu nome em alguma manchete. Confiante, jamais imagina os filhos a lhe indagar: "Papai, é verdade que você é corrupto?"

Ele não tem escrúpulos ao receber presentes caros de fornecedores. Também não vê problemas em, por exemplo, pegar carona em jatinhos de empresários. Os agrados caem bem e, assim, a burocracia que envolve as verbas públicas acaba sendo desvirtuada em favor destes “acertos”.

Tem também o corrupto que nunca menciona quantias, apenas insinua. Age com certa cautela como se estivesse convencido de que suas palavras podem render complicações futuras. Assim, há sempre alguma metáfora para amenizar as barbaridades. Nada é direto. Fala-se pelas entrelinhas.

O corrupto habitual pratica o famoso “toma lá, dá cá”. Seu lema é "quem não chora não mama". Não ostenta riquezas, não viaja ao exterior, parece ser pessoa pobre para melhor encobrir suas falcatruas. É o primeiro a indignar-se quando o assunto é a corrupção no país.

O corrupto exibido, por sua vez, gasta o que não ganha, constrói mansões e compra fazendas, convencido de que sempre poderá usufruir das benesses em ser puxa saco de gente influente. É daqueles que se vangloria de sua astúcia.

Quem não conhece o corrupto que diz orgulha-se do pai trabalhador humilde e da mãe batalhadora. Gosta de falar de sua origem, mas não deixa de estar convencido de que, tivessem eles as mesmas oportunidades de se meterem em trambiques, seus antepassados também não deixariam passar. Não se preocupa com os valores que multiplica em sua jornada, pois tem olhos apenas para o que pode ganhar. Julga ser um empreendedor bem sucedido.

O corrupto é cheio de dedos. Não pensa duas vezes em chegar perto dos honestos, aproveitando-se de sua sombra. É capaz de tratar os comandados com dureza parecendo o mais íntegro dos seres humanos. Acredita que todos o consideram de uma lisura sem igual O corrupto julga-se dotado de uma inteligência que o livra do mundo dos ingênuos e torna, supostamente, mais esperto que os seus semelhantes.

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