segunda-feira, 10 de setembro de 2018

AS CINZAS DE NOSSA HISTÓRIA

O incêndio que destruiu o Museu Nacional no Rio de Janeiro, e com ele mais de duzentos anos de história, não foi apenas um incêndio. As chamas são um triste símbolo de um país que nos últimos tempos resolveu abandonar a ciência, as artes e a cultura, em detrimento de uma estratégia mesquinha concebida a partir de interesses pessoais de quem deveria ser guardião de uma de nossas maiores riquezas: a própria memória.

As imagens das labaredas queimando parte de nossa herança cultural e histórica poderiam ser apenas um triste presságio às vésperas de uma eleição que se anuncia incendiária e incerta. Quem acha estranho tantos absurdos que estamos observando deveria analisar a tragédia sem deixar de lado os tantos desleixos de quem nunca soube preservar o seu legado. O Brasil parece ter uma vocação insana para ser um construtor de ruínas.

Um país que deixa sua memória virar cinzas corre o risco de aniquilar o seu presente para jamais alcançar um bom lugar em seu futuro. Um povo que ousa abandonar certos valores hoje, certamente buscará explicações para o insucesso na formação de novas gerações. Os seres humanos se constroem e se aperfeiçoam na sua percepção de mundo a partir daquilo que lhes é transmitido. Sem discernimento, crianças e jovens, acabarão como náufragos sem bússola, num mar já muito agitado pelas incertezas e os obscurantismos.

Sucessivos cortes de recursos para a educação e a falta de investimentos em áreas essenciais fizeram com que o nosso mais importante Museu fosse aniquilado. Enquanto isso, a poucos metros dele, há um estádio que recebeu mais de um bilhão de reais. Um descompasso tremendo e vergonhoso. O estrangulamento de nossas universidades, o descaso e o desdém, não denota apenas falta de interesse, mas, é o resultado de “um projeto” como já dizia Darcy Ribeiro. A destruição do Museu Nacional é uma vitória da intolerância que foi capaz de tragar mais de 20 milhões de bens culturais insubstituíveis para o Brasil, para a América latina e para a humanidade.

O incêndio é um crime contra a ciência que poderia produzir um conhecimento para uma vida melhor. Uma tragédia anunciada em uma nação que parece não se sentir incomodada com a destruição de sua fauna, de sua flora, da história dos povos indígenas, da colonização. É uma destruição não apenas de livros, de peças, de áudios, de imagens e de fósseis que sobreviveram a milhares de anos. Trata-se de vidas inteiras dedicadas à pesquisa, de um conhecimento acumulado para a humanidade, de um acervo imprescindível para as futuras gerações. Para mim, uma fotografia perfeita do país que nos tornamos. Insensível, ignorante, desigual, autoritário.

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